Brasil passa de consumidor a exportador de ecstasy

Mercado de drogas sintéticas avança no país,
que tem 1,65 milhão de usuários, segundo as Nações Unidas

Enquanto o mercado global de heroína e cocaína se estabiliza, o de drogas sintéticas avança. É o que mostra o Relatório Mundial de Drogas, divulgado nesta semana pelo Escritório sobre Drogas e Crime da Organização das Nações Unidas (Unodc) 2010, que analisou dados de 2008 sobre o consumo de drogas. Estima-se que no Brasil existam mais de 1,65 milhão de usuários de anfetaminas, ecstasy e LSD (sigla para dietilamina do ácido lisérgico), os principais representantes dessa classe de substâncias ilícitas. O uso está intimamente ligado ao público jovem e aos que querem emagrecer.

Recentemente, o Brasil entrou no rol de fabricantes de ecstasy. Em 2008, o primeiro laboratório da droga, de pequena escala, foi descoberto no país, mais precisamente em Pinhais, na região metropolitana de Curitiba. Na época, mil unidades foram apreendidas. No ano seguinte, um segundo laboratório, que produziu cerca de 2 milhões de comprimidos em pouco mais de um ano – quantidade três vezes maior que as 620 mil unidades apreendidas pela Polícia Federal entre 2002 e o ano passado –, foi fechado em Imaruí (SC). Neste ano, o país também entrou na lista dos “ex­­portadores” da droga. Apreensões de ecstasy na Holanda, Sué­­cia e França apontaram o Brasil como origem. 

Rivaldo Venâncio, chefe da Delegacia de Repressão a En­­torpecentes da Polícia Federal no Paraná, no entanto, diz que o tráfico de ecstasy e LSD é de difícil rastreamento e praticado, normalmente, por jovens de classe média. “Existe um movimento no sentido do Brasil para outros países no qual se ‘exporta’ cocaína e os traficantes recebem como pagamento não dinheiro, mas drogas sintéticas”. Ele explica que a apreensão é difícil porque essas drogas são de pouco volume e os traficantes, de alto nível social, não se encaixam no perfil normalmente investigado pela polícia. “Facilmente se esconde 200 pontos de LSD junto à bateria de um telefone celular”, exemplifica.

Dependência
A fundadora do Núcleo de Es­­tudos e Pesquisas em Atenção ao Uso de Drogas (Nepad) da Uni­versidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), a psiquiatra Maria Theresa Aquino, diz que o atendimento a jovens usuários de ecstasy aumentou muito tanto no núcleo quanto no seu consultório. “Mas a quantidade de dependentes da droga é ínfima”. 

O coordenador científico do Programa de Álcool e Drogas do Instituto de Psiquiatria da Universidade de São Paulo (USP), Arthur Guerra de Andrade, confirma o baixo grau de dependência do ecstasy em relação a outros entorpecentes. “Isso ocorre porque o uso dessa droga acontece em momentos específicos, dispersos, como as festas de fim de semana. Ninguém toma uma ‘bala’ (outro nome pelo qual o ecstasy é conhecido) e vai trabalhar.” O uso frequente da droga nos ditos momentos de lazer, no entanto, provoca dificuldades em se manter uma vida regrada, com consequências sociais, como a perda do emprego.
O psicólogo do Centro Psiqui­á­trico Metropolitano, referência para Curitiba e região, Vasco Carneiro dos Santos Filho, diz que em 30 anos de atuação atendeu dois casos de dependência de anfetaminas. “Há também os casos de associação de drogas. É muito difícil achar um usuário puro.”

Efeitos
O ecstasy é comercializado sob a forma de comprimido ou cápsula, geralmente com um símbolo gravado, sendo conhecido, entre outras nomenclaturas, por E, XTC, Adão e Eva, Pastilha. É como um medicamento sem controle de qualidade. Repetir uma dose que “não deu em nada antes” não significa estar seguro, já que a formulação pode ser totalmente diferente. 

Sintetizado e patenteado em 1914, inicialmente como moderador de apetite, o ecstasy tem seu efeito alucinógeno caracterizado por alterações na percepção do tempo, diminuição da sensação de medo, ataques de pânico, psicoses e alucinações visuais, e provoca efeitos estimulantes como o aumento da frequência cardíaca, da pressão arterial, boca seca, náusea, sudorese e euforia. Segundo os especialistas, essa combinação de efeitos pode levar a problemas como desidratação e hipotermia.

No caso do LSD, a experiência do usuário é bastante particular. Alucinógeno poderoso, com alguns microgramas tem-se uma gama de alterações, que dependem da história de vida e das expectativas de cada indíviduo. “Enquanto alguns experimentam um estado de excitação e atividade, outros tornam-se quietos e passivos. Sentimentos de euforia e excitação alternam-se com episódios de depressão, ilusões assustadoras e sensação de pânico”, explica o psiquiatra e pesquisador Luiz Renato Carazzai.

0 Responses